terça-feira, 16 de outubro de 2012

Trinta e cinco anos de trabalho, a aposentadoria que está iminente torna-se realidade, os planos, os sonhos que consumiram tanto tempo para serem elaborados, na prática exaurem-se em minutos.

Os anos vividos marcam a sua presença com as rugas tornando-se realidade, as doenças aparecendo mais amiúde, a vista pedindo lentes cada vez mais grossas, as costas arqueando, os pesos tornando-se cada vez muito mais pesados.

A vida torna-se monótona, com poucas atividades, os pensamentos passam a ser exclusivamente lembranças e recordações do passado, o prazer resume-se em ver o progresso dos filhos que, dia a dia, menos solicitações fazem.

Os amigos, a maioria casados, talvez mais felizes, pois conseguiram manter e conservar seus casamentos. Têm suas esposas como companheiras, seus lares se não são perfeitos estão pertos disso.

Por que algumas pessoas são mais felizes que as outras? Por que para uns a vida deu certo e para outros não? Estarão estas ultimas sentenciadas à solidão?

Mas num segundo mágico tudo se transforma. Perante aquela imagem feminina, a vista firma-se, o coração acelera, as pernas bambeiam-se, a sudorese aparece, aquela sensação do ar subindo pelo estômago, há anos desaparecida, é sentida em toda a sua amplitude. Num primeiro momento a prudência manda recuar. Seria a atitude mais sensata, mais correta, mais estratégica. Porém, uma coisa que os anos não conseguiram mudar ganha força. É a coragem, a mesma coragem da juventude e que está intacta. Ela manda que se vá em frente. E assim é feito.

Durante os poucos passos que os separam a mente trabalha fervorosamente. Onde estaria até então escondida tão perfeita criatura? Que teria ela para tanto me abalar? De onde teria tirado tanta beleza e simpatia? Seria a minha alma gêmea?

E seria. A paixão, aquela velha conhecida e que estava definitivamente guardada, trancada a sete chaves, desabrocha com uma intensidade jamais sentida. Tudo nela é perfeito: seu corpo, sua voz, seu jeito, seu perfume, sua prosa. As horas parecem passar tão depressa, não dando conta de tudo que se tem a falar. A separação temporária tem de ocorrer. Aparece então outra conhecida que estava adormecida: a ansiedade. Os minutos não passam, a hora do segundo encontro nunca chega, a insônia dá o ar de sua graça.

O marasmo da vida dá lugar à inquietação, à agitação.

O segundo encontro se realiza, assim como o terceiro, o quarto e os demais. A solidão é enterrada de vez. Tudo agora é feito em cumplicidade. Em gostosa cumplicidade.

É o amor, o verdadeiro amor que toma conta daquele corpo de 60 anos. O corpo é de 60, mas a alma de 18 anos. A autoestima renasce. Começa-se a praticar esportes, renova-se o guarda-roupa, passeia-se pelo shopping à procura de presentes para agradarem tão benquista pessoa.

Mas seria ela realmente tão bela? Tão simpática? Sua voz tão suave? Seu perfume tão estonteante? Sua prosa tão agradável?


 

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